Prática de enfermagem baseada em evidência sobre constipação intestinal em UTI - Revisão Sistematizada da Literatura

 

Isabela Valente Ribeiro. Aluna (o) do Curso de Especialização em Enfermagem em Alta Complexidade/Universidade Federal Fluminense(UFF). isabela.valente@yahoo.com.br

Profa. Dra. Isabel Cruz. Titular da UFF. isabelcruz@id.uff.br

 

Resumo:

Objetivou-se revisar as diretrizes de enfermagem com base em evidência para o enfermeiro intensivista na identificação de diagnósticos e prescrições de cuidados de enfermagem para o paciente com constipação intestinal com alcance do resultado no tempo de 7 dias. A Metodologia consistiu em estudo descritivo, pautado na revisão integrativa de literatura. Os artigos nacionais recentes selecionados foram publicados no ano de 2011 a 2018 e indexados no Portal de Periódico Capes e na Biblioteca Virtual em Saúde. Como resultado totalizou-se 50 artigos de forma geral. Após aplicar os critérios de inclusão e exclusão, foram selecionadas 07 produções. Conclui-se que a alta prevalência de constipação intestinal em pacientes internados na UTI gera complicações diversas, envolvendo maior tempo de ventilação mecânica, maior tempo de internação e maior risco de mortalidade. O enfermeiro deve buscar reconhecer os fatores associados a constipação intestinal, desenvolvendo um papel fundamental a prevenção, tratamento e orientação do alivio dos sintomas.

 

Descritores: Constipação Intestinal, Unidades de Terapia Intensiva, Enfermagem

 

Introdução

A eliminação no organismo humano pode ser definida como secreção e excreção de produtos residuais no organismo, onde na eliminação gastrointestinal ocorre o processo de absorção e excreção dos subprodutos da digestão(1). Logo, a função intestinal do paciente é influenciada por inúmeros fatores, como hábitos de vida, alimentação, hidratação, estresse psicoemocional, atividade física onde depende também de atividade intestinal autônoma e reflexa(2).

Relacionado a isso, a Constipação Intestinal (CI) pode ser definida como frequência de evacuações menor que três por semana ou mais de dois dias sem evacuar, geralmente acompanhada de dor, desconforto e esforço excessivo ao evacuar com fezes endurecidas, fragmentadas e com a sensação de defecação incompleta após a evacuação(2,3). A constipação associada a hospitalização ou ao paciente acamado é comumente relacionada a pacientes críticos, ao qual ocorre limitação ao leito, processo inflamatório, desidratação e distúrbios eletrolíticos, choques e, principalmente uso de medicações como ansiolíticos, opioides, antidepressivos, agentes diuréticos, preparações com ferro, relaxantes musculares e determinados antibióticos (3,4).

São inúmeras as consequências da constipação intestinal, aos quais podem estar relacionadas ao aumento da pressão intra-abdominal, redução do aporte nutricional, hiperproliferação bacteriana, lesão da mucosa intestinal e translocação de bactérias por essa mucosa lesada(5,7). O aporte nutricional inadequado pode acarretar piora do prognóstico por redução da força muscular global e da capacidade funcional, redução da capacidade de síntese de novos tecidos e da cicatrização de feridas, aumento do número de infecções, além de aumento do tempo de internação e da morbidade e mortalidade(7).

Destarte, a situação-problema se dá pela escassez de informação sobre a prática com base evidências científicas e suas diretrizes para o alcance do resultado de enfermagem sobre constipação intestinal para o(a) paciente de alta complexidade sob cuidados intensivos em, no máximo, 7 dias de internação.

O objetivo desse estudo é revisar as diretrizes de enfermagem com base em evidência para o enfermeiro intensivista na identificação de diagnósticos e prescrições de cuidados de enfermagem para o paciente com constipação intestinal com alcance do resultado no tempo de 7 dias.

Isso posto, ao refletir sobre a temática, emergiram diversos questionamentos ao qual convergiram para a seguinte questão norteadora: Com base em evidência, como otimizar o cuidado do enfermeiro para que o(a) paciente de alta complexidade alcance o resultado de eliminação intestinal adequada em, no máximo 7 dias de internação?

 

 

Situação- problema

 

Acrônimo

Descrição

Componente da questão prática

P

Paciente

Adulto ou Idoso com Constipação Intestinal

I

Diagnóstico e Intervenção

Constipação (00011), Risco de constipação (00015), Mobilidade no leito prejudicada (00091)

C

Controle/Comparação/Integração

Não se aplica

O

Resultado de Enfermagem (NOC)

Normalização total ou parcial da eliminação intestinal na UTI; será realizado controle para evitar a constipação intestinal na UTI

T

Tempo de 7 dias

Realizar procedimentos como enema, clister extração manual das fezes, ingestas de alimentos laxantes e óleo mineral quando possível

 

 

 

Metodologia

 

Trata-se de um estudo descritivo pautado na revisão integrativa de literatura, que visa a inclusão de pesquisas relevantes para a tomada de decisão e a melhora da prática clínica a partir da síntese de múltiplos estudos e assuntos publicados, bem como a apresentação de contribuições para novos estudos(8).

Seguindo essa ideia, para a seleção dos trabalhos incluídos foram estabelecidos os seguintes critérios de inclusão: artigos em português, textos completos, link para acesso disponível, publicados no período de 2011 a 2018, indexadas no Portal de Periódico Capes e na Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), visto que a mesma possibilita o acesso a diversas bases de dados, entre as quais: Scientific Eletronic Library Online (Scielo), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e Medical Literature Analysis and Retrievel System Online (MEDLINE).

Logo, a confecção dos dados foi realizada através de uma tabela no software Microsoft Office Excel 2013 utilizando as principais variáveis, sendo elas: autor(es), data e país; objetivo da pesquisa; população/amostra; tipo do estudo; principal(is) recomendação(ões); nível de evidência.

Além disso, foi utilizada uma estratégia com o acrônimo PICOT, que visa avaliar o paciente de alta complexidade e adulto/idoso com o diagnóstico ou condição médica (P), diagnóstico(s) e prescrição/protocolo de enfermagem (I), linha de cuidado e/ou diretrizes e/ou protocolos Interprofissionais (C), resultado de enfermagem (O) e, por fim, o tempo máximo 7 dias de internação em UTI ou Unidade de Alta Complexidade (T).

 

Resultados e Discussão

 

Ao iniciar as buscas no Portal de Periódicos Capes e na Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) através dos descritores Constipação Intestinal AND Unidades de Terapia Intensiva AND Enfermagem obteve 41 artigos na BVS e 9 artigos no Portal de Periódicos Capes, totalizando 50 artigos de forma geral. Desses, apenas 39 encontravam-se disponíveis em texto completo.

Somado a isso, ao utilizar os demais critérios de inclusão, tais como estar em português, recorte temporal entre 2011 e 2018 e link para acesso disponível, foram selecionados 14 produções ao todo. Por fim, ao realizar a leitura completa do artigo e verificar novamente a sua afinidade ao objetivo do estudo assim como a existência de duplicidade de artigos, foram selecionadas 3 produções, sendo essas utilizadas para a composição da atual pesquisa.

Visto a precariedade de estudos a respeito da temática, emergiu a necessidade de busca de mais artigos em outras plataformas, sendo utilizada o Google Acadêmico. Seguindo os mesmos critérios de busca descritos acima, foram encontrados 4 artigos, totalizando 7 ao todo. Dessa forma, o quadro 01 sintetiza as informações dos artigos selecionados.

 

Quadro 01- Quadro-síntese dos principais resultados por ano, base de dados, periódico (revista), título do artigo, autores e principais resultados.

Autor(es), Data

& País

 

Objetivo da pesquisa

 

População/ amostra

 

Tipo do estudo

Principal(is)

recomendação

(ões)

 

Nível de evidência

Nunes GKF e Rosa LPS; Abr.

 

2012;

 

Brasil

Identificar a frequência de complicações gastrointestinais pela terapia nutricional enteral em pacientes em admitidos na UTI

22 pacientes

Estudo observacional e prospectivo

Importância da utilização de protocolo e indicadores de qualidade em unidade de terapia intensiva

 

2B

Benedet SA,Brasil N.;

 

2012;

 

Brasil

Caracterizar as necessidades de cuidados de enfermagem dos pacientes internados em uma UTI a partir da identificação dos diagnósticos e intervenções de enfermagem mais frequentes

10 pacientes internados na UTI

Estudo exploratório descritivo, do tipo convergente assistencial.

Reafirmar a importância do uso de diagnósticos e intervenções de enfermagem em uma UTI.

1B

Guerra TL, Mendonça SS, Marshall NG;

 

Jun. 2013;

 

Brasil

Avaliar a incidência de constipação em pacientes críticos em uso de nutrição enteral internados em uma UTI

43 análises de prontuários

Estudo de caráter retrospectivo analítico

Não se aplica

2B

Costa NA, Vulcano DSB, Polla PMS et al.;

 

Jan-Mar 2013;

 

Brasil

Avaliar a incidência de CI em pacientes com nutrição enteral internados em unidade de terapia intensiva (UTI) e sua associação com o tempo de ventilação mecânica (VM), de internação e a mortalidade

26 pacientes em uso de dieta enteral de forma exclusiva

Estudo prospectivo

A criação e implantação de protocolos para o tratamento da constipação na UTI é de fundamental importância

1B

Campos CRL, Nascimento BF, Heringer GS, Borba LG, Setaro L et al;

 

Ago. 2014;

 

Brasil

Avaliar a prevalência de constipação em pacientes hospitalizados e seus fatores de risco

Entrevistados 36 indivíduos

Estudo prospectivo

Identificar precocemente os pacientes que podem desenvolver a obstipação a fim de aplicar terapia de caráter preventivo à constipação evitando posteriores complicações

1B

Schneider APGC, Mendonça SS;

 

dez. 2015;

 

Brasil

Realizar uma revisão crítica da literatura sobre os indicadores de qualidade em terapia nutricional em terapia intensiva

23 artigos selecionados, livros e 1 dissertação de mestrado

Levantamento bibliográfico de artigos científicos

Elevar a quantidade de estudos sobre a temática e sobre quais seriam os indicadores de fácil execução, baixo custo e com maior impacto para a assistência nutricional em UTI

3A

Feitosa TS, Assis RAS, Coelho ML.;

 

Maio-ago. 2018;

 

Brasil

Avaliar a prevalência de constipação, diarreia e a ausência dessas complicações em pacientes em terapia intensiva de um hospital universitário

53 pacientes, análise a partir de prontuários

 Estudo longitudinal e descritivo

Não se aplica

2B

Fonte: Dados da pesquisa, 2019.

 

Pode ser visto que nos anos de 2012 e 2013 obtiveram maior quantidade de publicações acerca da temática, com 2 artigos publicados a cada ano. Entretanto, ultimamente o número de artigos publicados foram pequenos ou inexistentes, visto que os anos de 2016 e 2017 não foram encontrados estudos, evidenciando aqui a escassez de pesquisa na área.

Isso posto, ao retomar a discussão acerca dos estudos encontrados, após categoriza-los, pode ser visto que a incidência de constipação intestinal em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) é relativa. Em alguns estudos (4,6,9,10) cerca de 32% a 76% dos pacientes apresentaram constipação intestinal (CI), sendo o sexo masculino de maior prevalência (6,10).

O uso de terapia nutricional enteral é comum na UTI pois garante o suporte nutricional necessário e evita a desnutrição do paciente hospitalizado, contudo essa via pode limitar a administração adequada de nutrientes nos pacientes, surgindo alterações no trato gastrointestinal, como a constipação, por exemplo(11). A identificação de pacientes que não evacuaram durante a terapia nutricional enteral foi avaliado por nutricionistas de um hospital universitário do Maranhão, onde no referido estudos 13,2% dos pacientes com dieta enteral apresentaram constipação(9), sendo os resultados associados ao maior tempo de internação.

Associado a isso, ao avaliar a constipação em pacientes críticos em uso de nutrição enteral internados em uma UTI no hospital de Brasília, foi visto que a incidência de constipação intestinal foi elevada em pacientes em uso dessa dieta com cerca de 72% dos casos(6), onde a ausência de evacuação não apresentou associação com o tempo de internação e suspensão do aporte nutricional enteral(6).

Em outro estudo(4), ao avaliar 23 pacientes com uso de dieta enteral de forma exclusiva, cerca de 50% apresentaram constipação intestinal em uma UTI. Os pacientes constipados demoraram mais tempo para atingir a meta prescrita de suporte nutricional, sendo aumentado a quantidade de calorias, proteínas e fibras nas suas dietas em relação aos pacientes sem constipação(4).

Outro fator importante é que a presença de constipação intestinal em pacientes utilizando dieta enteral na UTI é preditora de maior tempo de ventilação mecânica, maior tempo de internação, e consequentemente, maior risco de mortalidade (4).

Visto a proporção de complicações trazidas pela constipação intestinal em UTI, torna-se imperiosa a utilização dos diagnósticos e intervenções de enfermagem nesse setor, de forma a direcionar o atendimento individualizado das necessidades humanas básicas do paciente, possibilitando respostas eficazes e imediatas para a resolução dos problemas identificados(12).

Uma das propostas abordadas nas literaturas(11,13) é a utilização de protocolo e indicadores de qualidade em unidade de terapia intensiva, por meio de condutas padronizadas que reforcem a importância dos relatos dessas complicações durante a terapia nutricional enteral e tornem-se viáveis para monitorar a qualidade da assistência nutricional em pacientes internados na UTI, direcionando as propostas de estratégias para a melhoria da assistência em terapia nutricional.

 

Conclusão

No presente estudo pode ser notado a alta prevalência de constipação intestinal em pacientes internados na UTI, sendo o sexo masculino o mais frequente. As complicações são diversas, envolvendo maior tempo de ventilação mecânica, maior tempo de internação e maior risco de mortalidade.

Sendo o enfermeiro que faz o primeiro contato com o paciente e mantém-se próximo do mesmo, o profissional deve buscar reconhecer os fatores associados a constipação intestinal, desenvolvendo um papel fundamental a prevenção, tratamento e orientação do alivio dos sintomas. Desse modo, torna-se imperioso o conhecimento sobre a constipação, visando diminuir essa condição e as suas complicações na prática clínica.

 

 

 

Referências:

1. Herdman TH, Kamitsuru S. Diagnósticos de enfermagem da NANDA-I: definições e classificação 2018-2020 [livro online]. Porto Alegre: Artmed, 2018. [acesso em 02 out 2019]. Disponível em: < http://nascecme.com.br/2014/wp-content/uploads/2018/08/NANDA-I-2018_2020.pdf >

2. Oliveira RG. Blackbook-Enfermagem. 1. ed. Belo Horizonte: Blackbook Editora, 2016.

3. Hinkle JL, Cheever KH. Brunner & Suddarth: Tratado de Enfermagem Médico-Cirúrgica. 13 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017. vol. II.

4. Costa NA, Vulcano DSB, Polla PMS et al. Constipação intestinal prediz o tempo de ventilação mecânica em unidade de terapia intensiva. Rev Bras Clin Med [Internet] 2013 [acesso 2019 out 18]; 11(1). Disponível em: < https://repositorio.unesp.br/handle/11449/140449 >

5. Nassar AP Jr, Silva FM, Cleva R. Constipação em unidade de terapia intensiva: incidência e fatores de risco. J Crit Care [Internet]. 2009 [acesso 2019 out 18]; 24 (4). Disponível em: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/19592200 >

6. Guerra TSL, MSS, MNG. Incidência de constipação intestinal em uma unidade de terapia intensiva. Rev. bras. ter. intensiva [Internet]. 2013 [acesso 2019 out 18]; 25 (2): 87-92. Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-507X2013000200005&lng=en >

7. Azevedo RP, Machado FR. Constipação intestinal em pacientes graves: muito mais do que imaginamos. Rev. bras. ter. intensiva [Internet]. 2013 [acesso 2019 out 18]; 25(2): 73-74. Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-507X2013000200001&lng=en >

8. Mendes KDS, Silveira RCCP, Galvão CM. Revisão integrativa: método de pesquisa para a incorporação de evidências na saúde e na enfermagem. Texto contexto - enferm. [Internet]. 2008 Dez [acesso 2019 out 18]; 17(4): 758-764. Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-07072008000400018&lng=em >

9. Feitosa TS, Assis RAS, Coelho ML. Constipação e diarreia em pacientes internados em Unidades de Terapia Intensiva. J. Ciênc. Saúde [internet]. 2018 [acesso 2019 nov 18];1(2):63-72. Disponível em: < https://doi.org/10.26694/2595-0290.20181263-726919 >

10. Campos CRL, Nascimento BF, Heringer GS, Borba LG, Setaro L et al. Avaliação da modificação do hábito intestinal após admissão hospitalar. Rev. Nutr. Brasil [internet]. 2015 [acesso 2019 nov 18]; 14(1): 4-14. Disponível em: < https://portalatlanticaeditora.com.br/index.php/nutricaobrasil/article/view/236b >

 

11. Nunes GKF, Rosa LPS. Complicações gastrointestinais de terapia nutricional enteral em pacientes com estado crítico. Brasília Med [internet]. 2012 [acesso 2019 nov 18];49(3):158-162. Disponível em: < http://rbm.org.br/details/136/pt-BR/complicacoes-gastrointestinais-de-terapia-nutricional-enteral-em-pacientes-com-estado-critico >

 

12. Benedet SA, Brasil N. A sistematização da assistência de enfermagem e as necessidades de cuidados de pacientes internados em terapia intensiva. Revista Gestão & Saúde [Internet]. 2012 [acesso 2019 nov 18];3(2):800-15. Disponível em: http://www.gestaoesaude.unb.br/index.php/gestaoesaude/article/view/169.

13. Schneider, APGC.; Mendonça, SS. Indicadores de Qualidade em Terapia Nutricional em Terapia Intensiva. Rev. Com. Ciências Saúde [Internet]. 2015 [acesso 2019 dez 01] 26(3):127-132. Disponível em: < http://www.escs.edu.br/revistaccs/index.php/comunicacaoemcienciasdasaude/article/view/307 >

 





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