Workshop Enfermagem em Cuidados Intensivos: habilidades no uso do PEPSim

Isabel Cruz

Neusa Andrade 

Abstract: The adoption of electronic health records (EHRs) presents new challenges for nurses. This article describes a workshop using a simulated EHR to teach electronic documentation of a clinical case. 

Keywords

Electronic Health Records, Electronic Medical Record, EHR, EMR, Electronic Note, Transition to Internship, Informatics/Health IT, Nursing Process

Resumo: O Prontuário Eletrônico da Pessoa ou do(a) Paciente (PEP) representa um desafio para enfermeiras(os). Este artigo descreve a experiência de uma Oficina sobre o registro eletrônico do processo de enfermagem

Palavras chave

Prontuário Eletrônico do Paciente, Processo de Enfermagem

Introdução

Seja porque é preciso implementar a Estratégia de Saúde Digital 2020-20281 ou seja porque o sistema de saúde está se digitalizando, é preciso capacitar as(os) enfermeiras(os) sobre as tecnologias digitais de informação e comunicação em saúde. Dentre estas tecnologias, destacamos o Prontuário Eletrônico da Pessoa (PEP) por ser este um recurso que hospeda todas as informações sobre o(a) paciente coletadas em cada encontro clínico no sistema de saúde. 

Todavia, o processo ensino-aprendizagem-avaliação sobre o registro clínico no PEP suscita questões ético-legais as quais este artigo não pretende discutir. No sentido de superar este problema, é que se propõe o uso de PEPs simulados para fins educacionais2.

Para simular o PEP usado nas instituições de saúde, optamos por um software aberto, o OpenEMR3, e criamos na universidade uma plataforma para acesso: o PEPSim (http://pepsim.uff.br/).

Com base nos trabalhos de Zavodnick; Kouvatsos4  e de Yin, desenvolvemos um workshop para enfermeiras(os) de um curso de especialização em cuidados intensivos sobre o uso do prontuário eletrônico da pessoa. Mais especificamente sobre o registro dos dados coletados (histórico e evolução), do raciocínio clínico (diagnóstico), do plano (intervenção) e da documentação do cuidado direto do(a) paciente em geral.

Estabelecemos como objetivos de aprendizagem:

1. Manejar o prontuário eletrônico da pessoa (PEP) de forma completa, ainda que focalizada, visando obter informações sobre o atendimento à pessoa, por meio do estudo de caso no prontuário virtual simulado (PEPSim)..

2. Produzir uma documentação eletrônica segura e de alta qualidade, tendo ciência das armadilhas do PEP e dos múltiplos propósitos do registro clínico.

3. Implementar o processo de enfermagem no PEP quanto às informações obtidas da pessoa, família, entre outros, incorporando a prescrição médica computadorizada, o autocuidado, a educação em saúde, bem como o projeto terapêutico interprofissional quando necessário.

Preparamos o workshop usando um PEP simulado para o processo ensino-aprendizagem-avaliação dessas habilidades para estudantes da especializa Enfermagem em Cuidados Intensivos, sendo oferecido na forma de oficina, por meio de ensino híbrido e remoto. Portanto, a população alvo de pacientes são adultos ou idosos em situação crítica. Tal como Zavodnick; Kouvatsos, propusemos um caso clínico com um nível de complexidade adequado a qualquer enfermeira(o) com alguma experiência clínica.

Método

Conforme a Resolução CNS 510/2016, no Artigo 2º, item XVI, por ser uma atividade realizada com o intuito exclusivamente de educação, ensino ou treinamento sem finalidade de pesquisa científica, de profissionais em especialização, não foi necessária a submissão do protocolo deste estudo ao Comitê de Ética em Pesquisa.   

Uma semana antes do workshop, iniciamos no AVA a realização de pré-teste referente registro da(o) enfermeira(o) no PEP. 

O workshop foi realizado durante o curso de especialização por meio da sala virtual na Rede Nacional de Pesquisa (RNP). Todos(as) os(as) estudantes foram cadastrados e tiveram acesso à plataforma do Prontuário Eletrônico da Pessoa Simulado (PEPSim), da Universidade Federal Fluminense, disponível a vários cursos. O PEPSim, uma customização do OpenEMR, consiste tanto de casos fictícios quanto de casos reais anonimizados de pacientes, cujos dados provêm da Rede Nacional de Dados em Saúde (RNDS),  que são podem ser personalizados conforme a necessidade. 

Na nossa versão de workshop, considerando a pandemia de covid-19 em curso, optamos por usar um caso clínico extraído da literatura científica5 , com pequenas adaptações para propiciar o alcance dos objetivos de aprendizagem. Com base neste caso clínico, fornecido no Guia do(a) Estudante (Apêndice 1) , as orientações são:

  1. Faça login no aplicativo PEPSim.

  2. Encontre seu/sua paciente no “flow board” ou na lista de pacientes.

  3. Com base no seu caso clínico, crie um novo encontro

  4. Insira os dados subjetivos, os dados objetivos e os  dados na folha de sinais vitais. O seu julgamento clínico (diagnóstico), assim como o seu plano, é representado pelo processo de enfermagem, usando quando necessário o registro no formato de SOAP

  5.  Criar uma comunicação interprofissional para a equipe de saúde (SBAR) 

  6. Faça o log out

O workshop, de forma remota, durou 180 minutos. As autoras seguiram o Guia de Ensinagem (Apêndice 2).

No início do workhop, realizamos duas enquetes durante a introdução do tema. Veja no print da tela a seguir o resultado da primeira enquete.

enquete_1.jpg

Figura 1. Print da enquete durante Oficina

 

Ainda que nem todas as pessoas presentes tenham respondido à enquete, vemos na Figura 1 acima que grande maioria autoavaliou sua habilidade em informática/tecnologia de informação como boa (80%). Vale observar que em nível de pós graduação, uma parcela (19%) considera precária sua habilidade em TICs. 

Este é um aspecto a ser considerado, pois segundo Tilahun et al 6  o alfabetismo em informática mostrou ser um fator mediador no uso do PEP por profissionais de saúde, igualmente importante na satisfação do profissional de saúde em uso do PEP.

Na Figura 2 a seguir o resultado da segunda enquete.

enquete_2.jpg

Figura 2. Print da enquete durante Oficina

 

Mais uma vez nem todas as pessoas presentes na sala virtual responderam à enquete. Ainda assim, vemos que a maioria (68%) informou nunca ter usado o PEP antes desta Oficina. Neste sentido, cabe observar que treinamento apenas não é suficiente para o desenvolvimento da competência pois segundo constataram Kinnunem et al7 quanto maior a exposição ao uso do PEP, maior associação com a competência em registro clínico digital. 

Isto posto, demos seguimento ao workshop com uma breve apresentação de slides adaptados do estudo de Zavodnick; Kouvatsos, Yin e Pagulayan et al 8 (Apêndice X). Em seguida, foi distribuído online o Guia do(a) Estudante (Apêndice 1) para a turma.

Ainda que a sala virtual permita a criação de outras salas para trabalho em grupo, optamos pelo trabalho individual no PEPSim, sendo que a turma toda com o mesmo caso clínico. 

Após o login, em razão de uma limitação no papel atribuído ou defeito no sistema foi necessário que as autoras, na função de administradoras, atualizassem o cadastro dos(as) estudantes passando o seu acesso de “clínico” para “médico”. Este contratempo consumiu aproximadamente uns 20 minutos da Oficina, além de ser um fator de estresse para o aprendizado de um processo em uma outra tecnologia.

Refeito o cadastro, os(as) estudantes tiveram 20 minutos para trabalhar no PEPSIm com o caso atribuído e, em seguida, nós nos reunimos novamente como um grande grupo na sala virtual.

Quanto ao caso no PEPSim, foi apresentado o gabarito e em seguida dois estudantes se ofereceram para descrever sua abordagem e os desafios encontrados, assim como a forma de solução, seguindo este roteiro exibido na tela:

L O que você pensa agora sobre o PEP?
 
L O que ocorreu bem/mal na Oficina?
 
L O que você aprendeu com a Oficina?
L Que habilidades você precisa desenvolver para usar melhor o PEP?
 
L Como vou desenvolver as habilidades que preciso sobre o PEP? 

 As autoras, atuando como facilitadoras usaram os pontos de ensino no Guia de Ensinagem para orientar a discussão, tanto entre os(as) estudantes apresentadores(as) e a turma. Concluiu-se pela necessidade de dar continuidade ao treinamento durante o curso na plataforma. Um Mini-manual do PEPSim (Apêndice 3) foi disponibilizado no AVA para avaliar o alcance dos objetivos de aprendizagem e dar suporte no uso do PEPSim nos exercícios subsequentes. 

O pós-teste ficou disponibilizado por 72 horas após o workshop.

Resultados e Discussão

Vinte e oito estudantes realizaram o pré-teste. Vinte e sete estudantes participaram da Oficina online. Dezenove estudantes responderam ao pós-teste. Todavia, apenas 17 estudantes realizaram todas as atividades. 

No gráfico a seguir (Figura 3), estão representadas as respostas (N=17) no pré (colunas em azul) e pós-teste (colunas em verde) para as perguntas de autoavaliação sobre a própria habilidade quanto ao registro no PEP, a saber: 

Questão 6- Sinto-me confiante em consultar o PEP de maneira eficiente e completa

Questão 7- Sinto-me confiante para fazer registros e evoluções (SOAP, SBAR), evitando erros comuns no PEP

Questão 8- Sinto-me confiante para registrar o processo de enfermagem no PEP a partir dos resultados obtidos com o(a) paciente e outras fontes.

C:\Users\saude da familia\Desktop\Html Isabel\F3.jpg

 

Figura 3 Registro no PEP: Autoavaliação dos Estudantes no Pré e Pós-Teste

 

 

Essas perguntas foram elaboradas a partir dos objetivos de aprendizagem da Oficina. 

A leitura da Figura 23 revela que a Oficina não foi suficiente para aumentar a confiança do(a) estudante sobre o registro do processo de enfermagem no PEP. Isto também ficou constatado nos comentários do grupo no pós-teste. Três estudantes não recomendariam a Oficina em cursos futuros. Um(a) justificou por entender que nem todas as instituições de saúde utilizam o PEP. Outro(a) julga ser necessário organizar a dinâmica de ensino. E outro(a) julgou que de forma remota a Oficina tornou-se confusa e sugeriu que o treinamento seja de forma presencial. Catorze estudantes recomendaram a realização da Oficina em cursos futuros e sugeriram estratégias que nos remetem ao ensino híbrido, ou seja, conteúdos e exercícios prévios à Oficina sobre o PEP, bem como a disponibilidade de um manual para servir de roteiro durante o treinamento na plataforma.

Com base na rubrica Qualidade do Registro da[o] Enfermeira(o) no PEP (Apêndice 4), excetuando os itens sobre admissão, localização de exames e agendamento de consulta, analisamos os registros clínicos do grupo e notamos que apenas uma estudante, conseguiu realizar todas as etapas propostas. Todo o grupo foi capaz de localizar o(a) paciente que lhe foi designado(a). Nove estudantes conseguiram registrar satisfatoriamente o histórico de enfermagem no PEPSim, enquanto oito apenas parcialmente. Quanto à qualidade do registro SOAP, apenas quatro estudantes o fizeram e, mesmo assim, sem conseguir mostrar o seu julgamento sobre o(a) paciente. Nossa avaliação formativa sobre o registro clínico referente ao paciente foi compartilhada com o(a) estudante por meio do recurso mensagem no PEPSim.

 

Com base nestes resultados, nas sugestões dos(as) estudantes também, tendo em vista que os objetivos de aprendizagem não foram alcançados, as autoras ofereceram atividades suplementares para consolidação da aprendizagem sobre o registro clínico no PEP. 

 

Cabe observar igualmente que o exercício prático da Oficina foi baseado em um caso clínico num cenário. Este formato de atividade pode não ser familiar para todos(as) estudantes e, por conta disto, várias etapas do processo de enfermagem, apresentado de forma não linear, podem ser percebidas como difíceis de serem registradas no PEP. Neste sentido, adiantamos que o tradicional modo de ensinar o processo de enfermagem, mesmo em atividades práticas no prontuário de papel (nem sempre orientado por problemas, por ex), pode vir a ser uma barreira ao uso do PEP. Em seu estudo sobre o PEP, Pagulavan et al constataram que para melhorar o registro clínico da(o) enfermeira(o) era necessário re-introduzir o processo de enfermagem

 

A turma foi incentivada a acessar a plataforma para completar o exercício iniciado na Oficina. Uma vez que o PEPSim é uma “Sandbox”, após a Oficina, no período de duas semanas subsequentes, do grupo de 17 pessoas que compõem a amostra deste estudo, registramos que cinco logaram uma vez, um(a) estudante logou duas vezes e outro(a) logou 3 vezes. 

 

Conclusão

Sobretudo, vale ressaltar que este estudo nos permitiu constatar a viabilidade do OpenEMR como um recurso de simulação sobre o registro clínico em prontuário eletrônico.

No que se refere ao alcance dos objetivos de aprendizagem propostos, observando a literatura profissional sobre treinamento em PEP, podemos afirmar que há necessidade de um tempo maior de aulas e exercícios práticos. 

Por outro lado, a Oficina enquanto uma atividade de ensino-aprendizagem-avaliação teórico-prática com o PEPSim propicia o entendimento do prontuário eletrônico como um centro digital de informações do(a) paciente, com funcionalidades que têm o potencial de tornar mais rápido para as pessoas receberem os cuidados de saúde em tempo hábil, bem como um recurso tecnológico que, quando devidamente preenchido com dados de qualidade, fornece à equipe interprofissional de saúde as informações necessárias para prestar o cuidado certo no momento exato.

 

Referências





JSNCARE
Share |